Gastronomia . Gastronomy

Gastronomia e doçaria de Coimbra

A alimentação consagra, em si mesma, a arte de cozinha, mas não menos, a arte de receber, de conviver, de decorar. Tanto no passado como no presente, é uma linguagem reveladora de práticas, normas, comportamentos e éticas laicas e religiosas.

Coimbra orgulha-se de patentear uma identidade patrimonial inigualável, afirmando-se como a cidade do Saber e como Património dos Sabores. Na sua centralidade geográfica e histórica, é demarcada pelas serranias e pela planície do Baixo Mondego. Pelo rio circularam pessoas, ideias e bens que trouxeram a Coimbra uma amálgama de hábitos que a engrandeceram e a diversificaram. Alguns produtos vinham de longe, das culturas da Beira Interior, transportados nas barcas serranas e descarregadas no cais.

Da costa de Lavos, de Buarcos, de Quiaios e de Aveiro chegavam o sal, o pescado e o marisco. Presença constante na mesa portuguesa, o "fiel amigo" por cá perpetuou-se no bacalhau à moda de Coimbra.

Nas ribeiras capturava-se a enguia, sendo o Mondego rico em sável e lampreia. Os campos do Bolão e da Cidreira ofereciam os legumes, as hortaliças e o milho. A partir do século XIX, transformou-se num imenso e prodigioso espaço de verdes arrozais. Daí a lista de pratos como o arroz de lampreia à moda de Coimbra ou o arroz de polvo de Coimbra. Mas a zona do Mondego foi, igualmente, prodigiosa pela caça, de que tanto nos fala Miguel Torga, tendo chegado até nós a Perdiz fria à moda de Coimbra.

Mas Coimbra é indissociável da Universidade onde, desde o século XVI, se registam propinas dos doces, cujos gastos nos indicam que estavam ligados a cerimónias académicas, sendo comprados às religiosas da cidade, iguarias que até foram enviadas para Madrid.

Assim, as suas especialidades doceiras são, indubitavelmente, aquelas que se nos apresentam como um património marcadamente identitário. Esta doce herança de alguns conventos – Celas, Santa Clara e Santana, apresentam uma riqueza de formas, de cores e de sabores absolutamente notável. Testemunhos presentes nos manuscritos deixados pelas religiosas e nas obras de escritores que por aqui passaram. Eça de Queiroz enalteceu a deliciosa travessa de arroz doce que comeu na estalagem do Paço do Conde, Thomaz de Mello Breyner deliciou-se com os pastéis de Santa Clara, na época feitos pelas religiosas. Borges de Figueiredo atestou a celebridade do manjar branco de Celas e Trindade Coelho a marmelada do mesmo Mosteiro, que chegou "a adornar a mesa do Papa".

A arrufada de Coimbra, terá sido o bolo mais famoso da cidade. Saiu das portarias dos conventos e foi apregoado por mulheres nos mercados e no cais da estação. O pão de ló, fofo e "com o seu vestido amarello", integrou a lista das iguarias sentenciadas no "Suplício dos Doces", rábula satírica do século XVIII.

Em meados do seculo XIX, num contexto europeu de novas modas culinárias, terá surgido o Pudim das Clarissas de Coimbra, um tributo honorifico a uma grande casa monástica da cidade e onde não faltaram, como ingrediente, as célebres laranjas características da cidade.

No que toca a doces recriados, é importante mencionar (e provar) os Crúzios, o Bolo de Santo António ou mesmo os Biscoitos Académicos, todos eles exemplos de revitalização de receitas ancestrais. Estas receitas que têm dezenas ou mesmo centenas de anos, receberam uma adaptação à cultura moderna, mantendo o sabor que tinham antigamente. Mais recentemente foram criados dois doces que pretendem homenagear acontecimentos ligados à história de Coimbra: os Sonhos de Pedro e Inês, numa alusão ao trágico romance de D. Pedro e D. Inês de Castro; e a Rosa da Rainha em honra de Dª. Isabel de Aragão, a Rainha Santa.


Coimbra's Gastronomy and Pastry

Food embodies not only the art of cooking but also the art of hospitality, socializing, and decoration. It is a language that reveals secular and religious practices, norms, behaviours, and ethics, both in the past and the present.

Coimbra takes pride in its unparalleled heritage identity, asserting itself as the city of Knowledge and as a Heritage of Flavors. Situated in a geographically and historically central location, it is demarcated by mountains and the plain of Baixo Mondego. The river transported people, ideas, and goods that brought to Coimbra a mix of habits that enriched and diversified the city. Some products came from afar, from the cultures of Beira Interior, transported on serranas boats and unloaded at the docks.

From the coast of Lavos, Buarcos, Quiaios, and Aveiro came salt, fish, and seafood. A constant presence on the Portuguese table, codfish, the "loyal friend", perpetuated itself in the form of codfish à la Coimbra.

Eels were captured in the riverbanks, while the Mondego River was rich in shad and lamprey. The fields of Bolão and Cidreira provided vegetables, greens, and corn. Starting in the 19th century, they transformed into immense and prodigious rice fields. Hence the list of dishes like Coimbra-style lamprey rice or Coimbra-style octopus's rice. However, the Mondego area was also prolific in game, as described by Miguel Torga, and it brought to us the Cold Partridge à la Coimbra.

But Coimbra is inseparable from its university where, since the 16th century, we find records of sweets expenses, indicating that they were connected to academic ceremonies, being bought from the city's nuns, delicacies that were even sent to Madrid.

Therefore, its pastry specialties are undoubtedly what stand out as a markedly identity-rich heritage. This sweet legacy from some convents - Celas, Santa Clara, and Santana - presents a remarkable wealth of shapes, colours, and flavours. Testimonies found in manuscripts left by the nuns and in the works of writers who passed through here. Eça de Queiroz praised the delicious dish of rice pudding he ate at Paço do Conde's inn, Thomaz de Mello Breyner delighted in the pastel of Santa Clara, which was made by the nuns at the time. Borges de Figueiredo attested to the fame of the manjar branco from Celas and Trindade Coelho to the marmalade from the same Monastery, that one time "adorned the Pope's table."

The arrufada de Coimbra was perhaps the city's most famous cake. It left the convents' doors and was hawked by women in markets and at the train station docks. The sponge cake, fluffy and "with its yellow dress," was included in the list of confections sentenced in the "Torment of Sweets," an 18th-century satirical farce.

In the mid-19th century, in a European context of new culinary trends, the Pudim das Clarissas de Coimbra (Coimbra's Clarissas Pudding) is said to have emerged, an honorary tribute to a major monastic house in the city and where the famous oranges characteristic of the city were not lacking.

As for recreated sweets, it is important to mention (and taste) the Crúzios, the Bolo de Santo António (St. Anthony's Cake), or even the Biscoitos Académicos (Academic Biscuits), all examples of the revitalization of ancestral recipes. These recipes, which are decades or even centuries old, have been adapted to modern culture while maintaining their original flavour. More recently, two sweets were created to pay homage to events linked to Coimbra's history: the Sonhos de Pedro e Inês (Pedro and Inês' Dreams), alluding to the tragic romance of prince Pedro and Inês de Castro, and the Rosa da Rainha (Queen's Rose) in honour of Elizabeth of Aragon, Portugal's Holy Queen Elizabeth.

Fonte: https://www.cm-coimbra.pt/areas/viver/gastronomia  


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